Um saco super chique versus uma alcofa proletária
Há uns três anos comprei uma alcofa. Simples, Sem quaisquer enfeites, limpinha. E barata. A finalidade era personalizá-la à minha maneira.
Fui buscar a caixa dos novelos de linhas de crochet, escolhi cores diversas, e fui fazendo rosetas ao sabor da inspiração do momento. A minha mãe deu uma ajuda.
Por fim, aplico as rosetas na alcofa, compro um galão com pompons e ficou pronta. Peça única.
Poucos dias depois fui de férias e a alcofa acompanhou-me. Com a toalha de praia, o protector solar e um livro para ler. De manhã ia para a praia, ao fim da tarde para a piscina do hotel. Ora aí, alapava sempre ao nosso lado a mesma família – pai, mãe e menina .
Tinham pronúncia do norte.
Ele, sempre agarrado ao telemóvel e aos negócios. Presumo que era empreiteiro, pelas conversas que ia ouvindo. Peço desculpa, não fiz de propósito, não tenho o hábito de escutar conversas alheias mas o homem falava alto.
Ela, toda finaça, toda marcas chiques, patenteando bem o alto estatuto a que pertenciam.
Ele, alheado de tudo o que se passava à sua volta. Os afazeres profissionais não o deixavam usufruir do sol, da água, da espreguiçadeira, das férias.
Ela, sempre a olhar para mim… Sim sempre a olhar para mim.
Sim, eu sei o que estão a pensar. “Se sabes que ela olhava para ti é porque tu também olhavas para ela!”… Pois… mas não era exactamente a mesma coisa… Ela olhava ostensivamente, directamente, descaradamente… enquanto eu olhava disfarçadamente… dissimuladamente, como quem não quer a coisa. Punha os óculos de sol do meu marido, fingia que lia e olhava pelo canto do olho. Qual agente secreto em acção!
É que eu estava intrigada, mesmo muito intrigada! Que interesse teria eu para aquela senhora?
Quando queria chamar a minha atenção, porque me via mais entusiasmada com o livro que estava a ler e mais alheada do mundo à minha volta, a senhora tilintava as inúmeras pulseiras que trazia no pulso. Eu levantava a cabeça e uma vez captado o meu olhar, a senhora mexia e remexia ostensivamente no seu grande saco Louis Vuitton. Normalmente, nem tirava nem punha nada lá dentro. Só mexia no saco.
Do alto da sua imponência lançava-me um olhar altivo e um sorrisinho sobranceiro mal dissimulado.
Olhei-a mais atentamente. Afinal, o olhar da senhora não se centrava única e exclusivamente na minha pessoa. Ia oscilando de minha pessoa para a minha alcofa das rosetas.
Então fez-se luz!
A senhora estava incrédula que houvesse alguém, tão pelintra e com tão mau gosto que usasse uma alcofa de palha com rosetas em crochet do tempo das nossas avós! Como é que eu ousava pisar o mesmo espaço se vivíamos em galáxias tão distantes? Enfim, eu era quase um extra-terrestre.
Todos os fins de tarde se foram passando assim, iguais, repetindo-se a cena ao longo da semana. E cada uma ficou na sua. Ambas felizes e contentes com aquilo que somos e temos. Ela feliz e contente com o seu sofisticado saco, eu feliz e contente com a minha alcofa “made by Graça”.
Confesso que foram os fins de tarde à beira da piscina que até hoje mais me divertiram.
Acreditem, quem estivesse de lado a observar-nos fartar-se-ia de rir. Acho até que daria um filma cómico. Mudo!
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