Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Um ar de sua Graça

Os Natais da minha vida

Gosto do Natal. Embora esta quadra desperte em mim sentimentos contraditórios.


Incomoda-me o consumismo desenfreado, irrita-me a corrida desvairada de loja para loja. Choca-me o culto do objecto.


Gosto do Natal na sua verdadeira essência, pela celebração do nascimento de Jesus, pelo que simboliza em termos de partilha e de dádiva, de união da família.


Recordo com carinho os doces Natais da minha infância e adolescência. Vivendo longe de CASA, entendendo-se, por CASA a nossa terra natal e a casa dos meus avós, o Natal era o momento dos encontros familiares.
Quando vivíamos no Alentejo estávamos a cerca de 500 Km de distância. E, naquele tempo, 500 Km eram bem mais compridos de que hoje.


As estradas eram péssimas, estreitas, esburacadas e cheias de curvas. O nosso carro era velho, a cair de podre, comprado para aí em décima segunda mão. Numa única viagem tivemos três furos e demorámos 16 horas.


Mas chegávamos de coração cheio. E que alegria rever os meus avós, tios e primos, os tios que lá viviam e os que também, tal como nós, se deslocavam à terra para em conjunto celebrarmos a festa da família.   


Recordo as consoadas na cozinha do meu tio Zeca, junto da grande lareira à volta da qual todos nos reuníamos. Esqueciam-se as tristezas, as preocupações. Só havia alegria e boa disposição, celebrando o prazer de estarmos juntos. E que conversas saborosas adoçadas pelos velhozes que a minha tia ia fritando e que comíamos ainda quentinhos.


Depois, noite dentro, chegava o Menino Jesus. Descia pela chaminé e deixava os presentes nos sapatos que colocávamos na lareira antes de irmos para a cama.
A noite era mal dormida. Ansiavamos pelo clarear do dia para corrermos para a cozinha e depararmos com a surpresa dos presentes. Alegria no estado puro.
Tentei transmitir aos meus filhos a magia dos Natais que vivi. Mas não consegui competir com o markting televisivo nem com os coleguinhas de infantário que recebiam presentes oferecidos pelo Pai Natal colocados junto da árvore. De Menino Jesus nem rasto…


 Quando tentava que deixassem os sapatos junto do fogão, olhavam-me de soslaio,  argumentando com todo o pragmatismo que não havia Pai Natal que descesse pelo exaustor… E dei-me por vencida…  


Para mim, mais do que a árvore, são os presépios que melhor simbolizam o Natal. Representam a Natividade e a união da família.


Há poucos anos comecei a coleccioná-los. Presentemente são 101. Uns comprados por mim, outros oferecidos. Os meus filhos têm contribuído bastante para o engrossar deste número. Tenho-os nos mais diversos materiais, uns de prata outros de lata, de madeira, barro, pano ou serrapilheira. De plasticina, lã, cortiça ou com traços de tinta da China. Uns mais tradicionais, outros mais originais. Os nacionais e os internacionais.


Decorar a casa com eles leva o seu tempo. Muito tempo. Mas é grande o prazer ao ver a casa preparada para as festividades que se aproximam.

 

1 (1).jpg

2 (1).jpg

3.jpg

4.jpg

9.jpg

13 (1).jpg

8.jpg

5.jpg

6.jpg

7.jpg

10.jpg

11.jpg

12.jpg

14.jpg

15 (1).jpg

16 (1).jpg

17.jpg

18.jpg

 

 


   


 

Já não se escrevem postais de amor como antigamente – Parte II

Palavra de ordem: Organizar, Organizar

 

IMG_0311.jpg

 

A minha colecção de postais românticos foi crescendo ao longo dos anos e tem acompanhado a minha vida desde a adolescência até ao presente.


Depois de iniciar a colecção com os que encontrei em casa dos meus avós, com os poucos que consegui junto de familiares e amigos e com o substancial acréscimo com os que herdei do meu tio João, nunca mais deixei de comprá-los. Procuro-os em feiras e lojas de velharias e sempre que posso, em Lisboa vou até à rua do Crucifixo onde, numa loja no segundo andar de um prédio pombalino, a escolha de postais se torna uma tarefa tão difícil quanto entusiasmante. E que prazer folhear todos aqueles álbuns repletos de postais, sentir-lhes o cheiro, apreciar-lhes as cores, as texturas, os materiais.


Encontramo-los em seda, em papel de arroz, com bordados, rendas, missangas, lantejoulas, dourados, relevos, pintura à mão, mais antigos e mais recentes, postais fotográficos (usando a fotografia), postais cromolitografados  (recorrendo à ilustração), sendo estes últimos os meus preferidos. É não saber o que escolher perante tanta variedade, é ficar extasiada perante tanta beleza, é…perder a cabeça!

 

IMG_0344.jpg

 
Os preços variam conforme o estado de conservação, materiais usados, raridade, renome do ilustrador (neste caso em relação aos cromolitografados).
Infelizmente, o meu primeiro critério de selecção é o preço. Alguns são verdadeiramente proibitivos.  Revendo ao meus postais para este post , o que  já não o fazia há algum tempo, encontrei dois a 6000 escudos cada!!! O preço estava ainda escrito a lápis no verso. Para quem não recorda, 6000 escudos correspondem a 30 Euros!!!
Onde é que eu tinha a cabeça para dar tanto dinheiro por aqueles postais?! Devia estar verdadeiramente louca!


Depois de abrir os cordões à bolsa é o regresso a casa de coração cheio e de carteira vazia.


Em casa segue-se a etapa seguinte  – a organização – tarefa não menos agradável, que se vai fazendo aos poucos, lentamente, de acordo com o tempo disponível e por isso mesmo tão saborosa. Nem sempre é tarefa fácil mas também na dificuldade reside o encanto. Organizo-os por temas em dossiês, dentro de micas. Dossiês com casais, com crianças, com jovens raparigas, festividades, os dossiês com postais cromolitografados.

 

IMG_0329.jpg

IMG_0332.jpg

IMG_0334.jpg

IMG_0342.jpg

 
Dentro de cada temática integro-os em subcategorias. Só para exemplificar, relativamente ao tema crianças, tenho o subtema de bebés, crianças com brinquedos, crianças com animais, crianças com instrumentos musicais, crianças com livros, ao ar livre, etc, etc, etc.  

 
Por vezes não é fácil integrá-los numa categoria, porque o mesmo postal se pode enquadrar em várias categorias diferentes, como por exemplo, o que apresento a seguir que, sendo um  postal de Natal, nele podemos ver dentro da carruagem um par apaixonado. Onde colocá-lo? Festividades? Casais apaixonados?
Mas também estes dilemas, que acarretam alguma subjectividade, fazem parte do encanto do coleccionismo.

 

Uma particularidade deste postal é o facto de ter dupla face, o que não é muito comum.

 

IMG_0325.jpg

 
Estes postais românticos marcam uma época em que a comunicação se fazia de modo inteiramente diferente, a vida corria mais lentamente e as relações entre as pessoas estavam estruturadas de outra forma. São postais que durante anos e anos foram carinhosamente guardados e cuidados por quem os recebeu. Noivas, namorados, jovens aniversariantes. Enviados de mães para filhos, de filhas para mães, de madrinhas para afilhadas, de avós para netos…


Arquivados em deliciosos álbuns.


Por condicionalismos da vida os herdeiros venderam-nos a negociantes de velharias. Não me compete julgá-los.


Mas por vezes dou por mim a contemplar estes postais com uma pequena centelha de nostalgia. O que pensariam todos aqueles que, através dos postais, receberam mensagens de carinho e provas de amor, ao saberem que estes foram passando de mão em mão e que se encontram actualmente na posse de estranhos que nada sabem da sua história de vida?


É por tudo isto que aqui enuncio que os postais herdados do meu tio João me são tão queridos e ocupam um lugar privilegiado na minha colecção.   

 

IMG_0307.jpg

 

  Podem também seguir-me no Instagram!

 

 

Já não se escrevem postais de amor como antigamente - Parte 1

046FAC89-8CD5-4F7F-A903-B4F0E3333A32.jpeg

 

Tio João e Alice

 

Há objectos que me encantam. E se me encantam gosto de me ver rodeada por eles, coleccionando-os.

 

Das minhas colecções, a mais antiga começou na adolescência quando encontrei, por acaso, em casa dos meus avós, uma dúzia de postais românticos. Achei-os lindos. Havia-os com crianças sorridentes, casais abraçados, flores bordadas a seda. Fascinou-me o vestuário e acessórios usados, o mobiliário, caracterizando bem a época a que pertenciam. Alguns com cenários de paisagens produzidos em estúdio. Encantei-me com as cores, suaves e desmaiadas, com o cheiro do papel há muito tempo guardado.

 

E o texto? Sem nunca deixar de me sentir um pouco constrangida por violar a privacidade de quem os escreveu e recebeu, e ainda hoje assim acontece, não posso deixar de ficar fascinada com o rigor e perfeição da caligrafia de outrora, com a escrita escorreita e formal, com a delicadeza do tratamento entre as pessoas, mesmo que entre elas laços estreitos de familiaridade existissem. Logo me apercebi que os postais ilustrados são um manancial precioso de informações e de referências sobre a sua época, mais ainda para quem como eu gosta de História.

 

Entusiasmada comecei por perguntar a familiares próximos e pessoas amigas se não teriam lá por casa, postais românticos antigos esquecidos e abandonados algures e que não se importassem dos ofertar à minha pessoa. Nalguns casos tive êxito e da dúzia inicial passei a ter 15, 20.

 

E é aqui que surge o tio João.

 

O meu tio João emigrou para França à procura de melhores oportunidades de trabalho. Era jovem, solteiro. Lá conheceu a jovem francesa Alice, e apaixonaram-se. Mas a ameaça que pairava sobre a Europa, ensombrou este amor. Estava-se em 1939… e a segunda Grande Guerra rebentou. O tio João equacionou a vida. Decidiu acabar tudo o que entre eles havia e regressou a Portugal… sozinho. Regressou à terra, à família, à paz.

 

Mas a Alice não se conformava. E, inconsolável, durante alguns anos escreveu ao seu adorado “Jeannot” postais ilustrados, todos eles com casais apaixonadamente abraçados. Estes postais, eram diminutos rectângulos de cartão para tão transbordante, intensa e sofrida paixão. A Alice escrevia no verso, na frente, em todas as direcções, por vezes até sobre o rosto das personagens fotografadas, denunciando todo o desespero que este amor interrompido lhe provocava na alma.

 

8737DF06-8E15-494C-A727-D707303630AD.jpeg

CE4CF8CC-494A-4978-8B12-66A3BC747722.jpeg

  

O tempo foi passando e a frequência da escrita apaixonada da Alice foi-se tornando mais escassa. Até que terminou. Ter-se-á finalmente convencido da finitude daquele amor impossível? Talvez.

 

Não me recordo como o tio João soube da minha paixão por postais antigos. Mas nunca poderei esquecer o dia em que me apareceu com um envelope volumoso.

 

-Isto é para a menina. Era assim que me tratava.

 

Abri o envelope, incrédula. Aquele meu tio com uma colecção de postais românticos??? E foi então que ele me contou esta história.

 

Senti-me profundamente comovida. Pela história que desconhecia e, sobretudo, pelo facto de ele ter preservado estes postais durante mais de quarenta anos. A memória daquele amor continuava bem viva ao fim de tanto e tanto tempo. Comovida também pela responsabilidade que me atribuíra ao escolher-me para fiel depositária daquele espólio.

 

Os postais do tio João não são, de modo nenhum, os mais bonitos ou valiosos da minha colecção mas são, sem dúvida, os de maior significado. Porque conheço a sua história e pela responsabilidade que me foi confiada.

 

E quanto a isso, tio João e Alice, podem descansar em paz, os vossos postais estão em boas mãos.    

 

4A141C30-F8D6-4263-B6A7-C8EBCFCEFCD8.jpeg

4A7CFBA4-CB47-4330-A43E-8F41A9849545.jpeg

248619EB-9CB9-446C-8D10-DC436C7F898F.jpeg

 

 Podem também seguir-me no Instagram!